quarta-feira, 22 de abril de 2009

A formação do conceito de função

Os infatigáveis construtores de tabelas

Os babilônios foram infatigáveis construtores de tabelas.Em plaquetas de argila, material de escrita que usavam, deixaram até tabelas de raízes quadradas e cúbicas. Uma plaqueta por volta do ano 2000 a.C., por exemplo, traz uma tabela de n ³ + n ² , para n = 1,2,3...,30.

n

n³+n²

1

2

2

12

3

36

4

80

...

...

29

25 230

30

27 900

Obviamente essa tabela poderia ser associada à função definida em A={1,2,3,...30}, cuja lei de correspondência é f(n) = n³ + n². No entanto, como essa tábua foi provavelmente construída para permitir a resolução de equações do tipo n³+n²=c, pode ser que, com seu uso, os babilônios tenham tangenciado também a idéia de função inversa. De fato, a solução n³+n²=80 é 4 (como se vê na tabela), ou seja, é f(80).

A primeira tabela trigonométrica

Os gregos, posteriormente, chegaram mais perto ainda da idéia de função, como se nota na primeira tabela trigonométrica conhecida, que pode ser encontrada no livro Almagesto (“O maior”), de C. Ptolomeu (séc II d.C.), o mais importante tratado de Astronomia da Antiguidade. Primeiro, porque essa tabela foi de corda de um ângulo central, o ancestral mais antigo de nosso seno; segundo porque Ptolomeu mostrou como calcular, por interpolação, quaisquer valores de uma corda mesmo que não figurasse da tabela.

Galileu e a ideia de função

No período medieval pouco se acrescentou à formação do conceito de função, ate porque o desenvolvimento desse conceito dependia muito de dois progressos científicos que só ocorreram mais tarde. O primeiro que teve como pioneiro francês F. Viète (1540-1603) foi a criação da álgebra literal, que introduziu a linguagem das formulas na matemática. O outro devido principalmente a Galileu Galilei (1564-1642), foi a criação do moderno método científico, baseado na experimentação e na coleta de dados; da analise desses dados resultavam as leis básicas da física, frequentemente traduzidas em funções. Era necessário estudar essas funções para aprofundar o conhecimento físico.

Por isso há historiadores que vêem na obra de Galileu o germe do conceito de função. Entretanto, como a Álgebra Literal era uma invenção recente, ainda em fase de aceitação e difusão, quando Galileu escreveu seus trabalhos, ele não a usou para expressar as leis que obteve experimentalmente. Em vez disso, Galileu usou a linguagem verbal, como na seguinte lei enunciada em sua obra Diálogos sobre duas novas ciências(1638): “Os espaços percorridos por um corpo que sai do repouso em movimento uniformemente acelerado estão entre si como os quadrados dos tempos gatos para percorrê-los”. Em notação moderna isso significa que, se para percorrer um espaço clip_image002 o tempo gasto é clip_image004 e para percorrer um espaço s (genérico) é t, então clip_image006. Com a difusão da simbologia algébrica moderna, essa relação passaria a ser descrita pela lei clip_image008, em que clip_image010 é constante.

A moderna ideia de função

Na segunda metade do século XVIII, o matemático alemão G.W.Leibniz (1646-1716) introduziria a palavra função para designar uma quantidade variável de um ponto a outro de uma curva, como por exemplo, a ordenada. Deve-se a Leibniz, ainda, a introdução das palavras constante e variável, com seus significados matemáticos atuais. No entanto, a notação f(x) para indicar uma função só seria introduzida em 1734 pelo grande matemático suíço L. Euler (1707-1783)

Em 1837, o matemático alemão P.G. Lejeune-Dirrichlet (1805-1859) chegou perto da definição elementar moderna de função. Para isso, ele primeiro formulou a idéia de variável como um símbolo como representa indistintamente qualquer elemento de um conjunto de números. Depois caracterizou o conceito central: uma variável y se diz função de uma variável x, se, para todo o valor atribuído a x, corresponde, por alguma lei ou regra, um único valor de y. Nesse caso, x denomina-se variável independente e y, variável dependente.

Com a criação da teoria dos conjuntos, nos fins do século XIX, tornou-se possível definir função da seguinte maneira: “sejam A e B conjuntos;uma parte f de A X B chama-se função de A em B se, para todo x E A, existe um único y E B tal que (x,y) E f. Nessas condições, escreve-se f: A à B e f(x) = y”. Curiosamente, é por essa definição- talvez a mais moderna e rigorosa- que a milenar tabela babilônica mais se aproxima da ideia de função. De fato, basta considerar cada uma de suas linhas como um par ordenado (a segunda linha, por exemplo, o par (2,12)) e identificar a tabela com o conjunto f-{(1,2),(2,12),(3,36),...,(30, 27 900)} que, no contexto em pauta, é uma função de {1,2,3,...,30}em R.

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